O VALOR DAQUILO QUE NÃO TEM PREÇO
“Vivemos em um mundo onde tudo tem preço, mas quase nada tem valor, e as poucas coisas que têm valor, poucos sabem valorizar”. Esta interessante afirmação é atribuída à escritora Clarice Lispector. A meu ver, adequa-se muito bem às reflexões em torno da tragédia ocorrida em Brumadinho, com desdobramentos em outras regiões de Minas Gerais. Mais uma vez, acompanhamos estupefatos as notícias acerca de laudos inverídicos, omissões planejadas e atos que demonstram descaso com a vida. A fauna e a flora de elevado valor receberam um preço baixíssimo no mercado da mineração predatória. Famílias têm descoberto que o valor das vidas perdidas como consequência de mais um rompimento de barragem foi esquecido. A Companhia Vale do Rio Doce lhes atribuiu um preço baixíssimo.
Desde os tempos de colônia, quando a metrópole portuguesa enxergava o preço daquilo que estava no subsolo mineiro e desconsiderava o valor daquilo que estava no solo desta boa terra, Minas Gerais tem sido vista por governos e companhias apenas como um conjunto numeroso de minas. Falta quem perceba as riquezas gerais de vidas que aqui existem e acontecem. Certamente, muitos acionistas da Vale nunca estiveram em Minas Gerais, pouco ou nada sabem da história desta terra e jamais sofrerão as graves consequências, provavelmente irreparáveis, do desequilíbrio ambiental estabelecido mais uma vez pela intervenção humana na terra das Alterosas.
Temos chorado suficientemente a perda de mais de 330 vidas, dentre corpos encontrados e desaparecidos há mais de duas semanas? Temos testemunhado a agonia dos peixes que pulam para fora do rio numa busca desesperada por oxigênio? Ou temos sido dessensibilizados pela farta propaganda da tragédia a cada instante? Estamos nos acostumando com as justificativas do mercado que apontam para a perda de receitas e empregos, caso haja interrupção da atividade mineradora em muitos locais que abrigam barragens sob suspeita de irregularidades? Será que já esquecemos Mariana, Barra Longa, Governador Valadares, Colatina e a praia de Regência?
Não é aceitável que tudo seja colocado na gôndola do mercado e receba um preço. Vidas têm valor, não cotação. Segundo as Escrituras, “viu Deus tudo quanto fizera, e eis que era muito bom” (GÊNESIS 1:31). Quanta alegria demonstrou o Deus Criador frente ao seu plano perfeito. Harmonia, diversidade, beleza, originalidade. Deus “amou o mundo” (JOÃO 3:16) e nos presenteou com a oportunidade de desfrutarmos da sua criação. O mundo do capital, o afã por acumular aquilo que daqui não iremos levar e a adoração às coisas são criações nossas, frutos do coração mal que, sob a ditadura do pecado, estabelece preço para aquilo que tem valor incalculável.
A vida é tão valiosa que não devemos colocar preço na criação divina. É preciso humildade e submissão à vontade do Deus que se revela nas Escrituras para abandonarmos o modelo de vida falido que tanto valorizamos em nossa geração. Ou vamos esperar chegar o tempo em que daremos valor àquilo que não mais poderemos comprar?
Pr. Tarcísio Farias Guimarães