Nestes dias de constantes inovações no cenário evangélico, devemos refletir acuradamente acerca das práticas que cercam as Igrejas Batistas e que, não raras vezes, promovem alguma dúvida até entre crentes maduros. Precisamos reafirmar nossa crença na inerrância e na suficiência das Escrituras Sagradas, posição que nos tem permitido construir uma história de bom testemunho e fidelidade à sã doutrina. Imitemos, pois, os crentes da Beréia, lembrados por viverem “examinando cada dia nas Escrituras se estas coisas eram assim” (Atos 17:11).
Multiplica-se a quantidade de crentes que defendem a utilização da unção com óleo sobre enfermos para promover cura ou algum outro benefício espiritual. Há pastores que argumentam ser esta prática válida para os nossos dias e isto fazem amparados em Tiago 5:14, que diz: “Está alguém entre vós doente? Chame os presbíteros da Igreja, e orem sobre ele, ungindo-o com azeite em nome do Senhor”. E assim, pouco a pouco, abre-se espaço para o paganismo já assimilado pelo catolicismo e por outros grupos de tradição evangélica, bem como para a restauração de práticas cúlticas judaicas que, na verdade, tiveram caráter simbólico e transitório, tendo sido substituídas pelo relacionamento pessoal do crente com Deus, pois, o Espírito de Deus habita o crente após a sua conversão a Cristo. Este Cristo é o Ungido de Deus e, por meio dele, os crentes são suficientemente assistidos, sem que haja necessidade de se utilizar lugares, objetos ou palavras mágicas para que lhes seja concedida alguma bênção.
O Novo Testamento utiliza-se de dois verbos para unção. O primeiro é chrio, que dá origem ao vocábulo Cristo e aponta para a unção nos rituais consagratórios de oficiais, reis e sacerdotes. Aparece nos seguintes textos: Lucas 4:18; Atos 4:27, 10:38; II Coríntios 1:21; Hebreus 1:9. Concordo com Leonardo de Souza Guimarães quando afirma que este verbo “tem o significado original de unção ritual. Se Tiago tivesse em mente a unção do azeite como um ritual envolvido na oração, ele teria usado o verbo chrio e não aleipho, como ele fez” (1). J.J. Von Allmen assevera que, no Novo Testamento “o óleo não figura mais como ‘sinal visível da graça invisível’”(2).
O segundo verbo, facilmente encontrado nos escritos gregos de Filo, Plínio e do médico Galeno (3), é aleipho, significando untar ou esfregar. Aponta para a unção terapêutica, ou seja, para a aplicação de óleos sobre o corpo do enfermo. Este é o verbo empregado em Tiago 5:14 e que figura em Marcos 6:13. Há ainda a utilização de aleipho para descrever a unção com aromas e perfumes (Marcos 16:1; Lucas 7:38,46). No mundo antigo, a unção com óleos e outros extratos da natureza era um recurso muito utilizado pela medicina. Aparece em II Reis 20:1-7 e, de forma poética, em Isaías 1:6. Numa parábola contada por Jesus, a unção com azeite e vinho é parte do atendimento de primeiros socorros prestado por um samaritano a um homem ferido (Lucas 10:34). Jesus censura o sacerdote e o levita que não prestaram socorro, o que era inaceitável numa época em que a autoridade religiosa chegava antes do médico e prestava o primeiro atendimento, utilizando-se de óleos e azeites, orando pela recuperação do mesmo (4). Ainda hoje, os médicos utilizam-se de muitos tipos de óleos para tratamento de saúde, os quais tem ação comprovada na recuperação de certas enfermidades.
Não há qualquer proibição na Bíblia para a aplicação dos recursos medicinais aos enfermos e nem mesmo a quem exerce o ofício de médico (Colossenses 4:14; I Timóteo 5:23). Devemos ainda hoje utilizar a assistência médica com oração em nome do Senhor Jesus. Este é o ensino claro de Tiago. Em sua soberania, Deus utiliza-se de variados meios e os crentes jamais devem questionar os recursos divinos para atender seus filhos (Mateus 26:42). Não se censura na Bíblia os crentes que adoecem ou enfrentam alguma outra intempérie da vida (Filipenses 2:25-27; II Timóteo 4:20). Essa associação cabal da enfermidade com pecados ou maldições é mais uma heresia dos nossos dias.
Não podemos esquecer que há curas na Bíblia sem a aplicação da unção com óleo e que outros meios também são utilizados, dando-nos a compreensão do poder de Deus que manifesta-se aos olhos daquele que tem fé, conforme a vontade livre do Senhor (Tiago 5:15). Jesus ungiu com lodo um cego de nascença e ordenou que ele se lavasse no tanque de Siloé (João 9:6,7). Em outra ocasião, apenas tocou os olhos de dois cegos (Mateus 9:29), assim como curou o cego de Jericó sem utilizar-se do lodo ou mesmo tocar nele, segundo o relato das Escrituras (Lucas 18:42). Os crentes batistas não precisam e não devem praticar a unção com óleo sobre enfermos, pois, esta prática está em desacordo com o ensino das Escrituras e não reflete o ensino de Tiago. O que nos é ensinado é a validade da oração e dos medicamentos para a restauração do enfermo. Devem os pastores e outros crentes consagrados promover assistência aos enfermos com oração, crendo que o nosso Deus pode restaurar a saúde abalada (Mateus 18:19,20; II Tessalonicenses 5:14). Ainda hoje a oração do justo pode muito em seus efeitos (Tiago 5:16). Creiamos nisto!
Pr. Tarcísio Farias Guimarães
Notas: (1) GUIMARÃES, Leonardo de Souza. Devem os batistas usar a unção com óleo? Disponível em: < http: www.adiberj.org > Acesso em: 17/08/2011. (2) VON ALLMEN, Jean-Jacques. Vocabulário Bíblico. São Paulo: ASTE, 1972, p. 431. (3) TAYLOR, William Carey. A Epístola de Tiago. Rio de Janeiro: Casa Publicadora Batista, 1965, p. 132. (4) BARCLAY, William. El Nuevo Testamento Comentado. Vol. 14. Buenos Aires: La Aurora, 1974, p. 152.